Sei bem o que sentiu minha irmã quando leu esse artigo. Talvez menos um pouco do que ela que viveu muito mais perto dele que eu. Tem uma música do Renato Russo que me faz derramar lágrimas sempre que ouço. Diz mais ou menos assim:
" É tão estranho. Os bons morrem jóvens... e assim parece ser quando me lembro de você. Que acabou indo embora, cedo demais."
Saudades do meu querido cunhado que partiu cedo demais.
........
11 de agosto, quinta- feira próxima,
Almiro Vieira dos Santos Filho
( 1961- 1998) faria seu cinquentenário.
E se o que seria aniversário me
reaviva o luto de forma ainda mais
densa não é tão - somente por ele ser
meu irmão caçula e por termos tido
uma monolítica amizade desde a
infância , mas também em função de
seu significado para a história do
cinema no Ceará.
Nas décadas de 80 e 90, esse
produtor - historiador atuou para que
filmes como Caminhos sem fim , de
Heitor Costa Lima (1949 ) e Padre
Cícero : Milagres do Juazeiro, de Helder
Martins (1975 ) fossem restaurados,
além de liderar a produção de Cinema
Cearense: Alguma História, média-
metragem de Firmino Holanda (1989 )
sobre os primórdios de nossa
cinematografia . No campo das
iniciativas de criação , Almiro produziu ,
dentre outros , os curtas Um cotidiano
perdido no tempo (1988 ) e Último dia
de sol , de Nirton Venâncio (1999 ).
Em parceria com Ernani Paiva realizou
trabalhos de publicidade e
propaganda em diversos estados do
Norte e Nordeste . Sob o patrocínio da
Universidade Federal do Ceará
viabilizou com Pedro Jorge de Castro o
I Festival de Cinema de Fortaleza
( 1985) , e com Dulcinéia Gil , a edição
do FestRio no Cine São Luiz (1889 ). No
final dos anos 80 presidiu a Secção
estadual da Associação Brasileira de
Documentaristas e criou o Cineclube
Di Maio. Na Secretaria da Cultura do
Estado ( gestão de Violeta Arraes )
dirigiu o Departamento de
Audiovisual .
Meses antes de ser surpreendido por
um infarto fulminante em 1998 ,
prestes a fazer 37 anos , Almiro estava
em entendimentos com o nosso
Museu da Imagem e do Som para
implantar um projeto que objetivava
telecinar filmes alusivos ao Ceará,
constituir acervos cinematográficos e
compor biblioteca de roteiros.
Fiel à paixão de descobrir referenciais
da memória do povo cearense , sua
vida foi um deixar-se tomar talvez por
impulsos proustianos e efetuar
processos regressivos em busca de
um tempo perdido que, no entanto ,
não era o seu . Lutava contra os
inexoráveis desgastes dos fotogramas,
certo de que o passado não é apenas
o que passou , mas , sobretudo , o que
o presente filtra e ressignifica .
Perscrutando intrincados indícios em
cinematecas e arquivos , públicos ou
não, sua pesquisa tinha a aura da
mítica Ariadne, desemaranhando fios
para resgatar do labirinto vestígios do
que parecia às vezes já não mais
existir . Nenhum empecilho o
desmotivava , mesmo que tivesse de
revolver películas dos escombros .
Quanto maior fosse o desafio de
garimpar uma raridade , maior o seu
fascínio diante do achado. Garimpava
imagens como quem no cascalho
procura pedras preciosas.
É assim que o revejo, de modo
recorrente , em sonho: exultante como
um menino que com a última figura
em mãos completa finalmente um
quebra - cabeça . Entretanto , ao
acordar e relembrar sua morte
repentina e prematura , persiste em
mim a sensação de que a peça
fundamental desse quebra -cabeça se
perdeu para sempre e não resta , pois ,
mais nada que possa se encaixar para
preencher o vazio .
Ricardo Guilherme
ricardo - guilherme@uol .com. br
Teatrólogo , escritor e membro do
Conselho de Leitores de O POVO
Nenhum comentário:
Postar um comentário